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domingo, 8 de abril de 2018

Um turbilhão de emoções contraditórias e complementares

Tantas coisas aconteceram e não escrevi.

Tantas coisas que mudaram minha vida, meu 2018 começou catastrófico e negro. Sentia-me num vazio que sugava qualquer energia minha, parei o que pude pra ter os últimos momentos do meu pai, Luz da minha existência, antes da nossa separação. Eu quis acreditar num milagre, num erro médico, mas ele não veio. Meu pai desencarnou e eu fiquei.

E fiquei sozinha. Não sem amigos, mas cada um me dedicava um pouco de seu tempo como podia, e nem sempre isso era suficiente. Eu também não podia ficar com eles porque não podia deixar minha mãe - fiz uma promessa ao meu pai, já no leito de morte, de cuidar dela.

Não sei descrever o que eu sentia. Saudade, dor, medo, responsabilidade, tristeza - uma tristeza profunda, cruel, voraz, que me engolia e me amarrava. Eu não sabia como seguir adiante, mas sabia que precisaria fazê-lo - era isso que meu pai ia querer, como a vida inteira ele quis pra todos que amava.

Mas o mundo não parou pra eu chorar tudo o que eu precisava. As férias que eu pedi às pressas, e que me deram o tempo que restava do meu pai, as primeiras semanas pra cuidar da minha mãe e de mim, logo acabaram. E eu tive que voltar pra minha realidade louca e agressiva, cheia de gritos, ataques, cobranças, horários, e-mails. 

Não voltei bem, era impossível. Voltei pq era necessário. Passei semanas fora de rotação, sem saber direito como trabalhar, sendo levada pelo que aparecia. Chorando com clientes que eu não conhecia, mas que estavam passando ou já tinham passado pela mesma dor que eu. Expondo para estranhos o quanto sangrava o meu coração, porque eram os anjos do Eloy que me vinham pra aliviar um pouco o coração. A palavra "câncer" nunca mais soou neutra pra mim - ela passou a ser uma ferida aberta, um gatilho que despertava um lado humano que eu sempre escondi.

E no meio desse tumulto, dessa fase tão confusa, dessa loucura, quando estava prestes a fazer um mês que perdi meu pai, mais uma pessoa veio até minha mesa reclamar, e mudou totalmente o curso em declive no qual eu me encontrava. Uma pessoa que, como eu, também chorava a perda de quem amava para o câncer - uma perda também recente, uma história de luta e de angústia que durou 3 anos e que terminou no mesmo dia em que, naquela sala da Beneficência Portuguesa de SP, eu soube que a partida do meu pai estava muito, muito próxima. Uma pessoa que não ouviu meu desabafo com a mesma doçura que eu estava falando, pq naquele momento tudo meu era empatia e dor, mas que mesmo assim o trabalho me fez manter contato por uma pendência que aconteceu durante minha ausência.

E esse contato gerou um elo pelos próximos dias, semanas. E que eu não sabia nem queria lidar, a ausência do meu pai era o Sol da minha existência (ou melhor, sobrevivência) naquele momento. E tentei repelir, mas em vez de ir embora, ele ficou. E veio com todas as qualidades que eu pedia tanto - alguém que me escutasse, que me transmitisse sabedoria, que fosse o homem da relação, que cuidasse de mim.

E comecei a me permitir me sentir feliz. Me sentir cuidada. Não sei se meu caminho pra conhecer alguém ficou bloqueado pra que eu pudesse cumprir meu resgate com o meu pai ou se enviaram alguém pra cuidar da gente, pra que o meu pai em espírito possa seguir o caminho dele. Talvez eu só saiba essa resposta em outro plano. O fato é que ele me tirou daquela espiral descendente em que eu me encontrava e me proporciona momentos da mais profunda felicidade. Plena. Completa. Com admiração, com carinho, com companheirismo. 

Tudo hoje é muito intenso, muito recente, muito forte. Talvez quando essa fase terminar, o coração assentar, um de nós perceba que não era bem isso. Mas o fato é que, hoje, a presença de um na vida do outro tem nos ajudado a seguir adiante.

Voltei para a terapia na última quinta-feira. Com a Scatena, claro. Sinto que muitas caixinhas estão fora do lugar e preciso de ajuda para organizá-las novamente. Estou feliz, mas a falta do meu pai ainda é enorme. Dizem que nunca vai passar, e eu já estou começando a aceitar que realmente não passa. Ninguém jamais vai substituir meu pai. Mas o que ele mais queria era que eu fosse feliz e que minha mãe e eu nos entendêssemos, e isso está acontecendo.

Pai, a gente vai ficar bem.