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quinta-feira, 1 de fevereiro de 2018

Ah, Pai! Por que meu pai???

Nunca imaginei que um dia escreveria sobre isso. Sempre acreditei que o câncer não entraria em nossa casa. Mas ele entrou, sem convite e sem avisar. E quando nos demos conta, a casa já era dele.

Ah, pai! Como eu vou sentir sua falta! Como eu vou ficar perdida sem você pra cuidar de mim, do meu carro, do meu juízo! Sem você pra me aconselhar com sua sabedoria nos meus rompantes de ira e destempero.

Ah, pai! Você prometeu que ia cuidar da minha mãe, que ainda ia comigo conhecer o mundo, que ia parar de trabalhar pra conhecer Portugal com a mãe. A gente queria levar o Rômulo pra viajar, voar, ganhar esse gosto que nos unia.

Ah, pai! Quem vai ficar puto com o Santos comigo agora? Com quem eu vou discutir tabela, perguntar como mexer na escalaçao e falar palavrão em coro?

Ah, pai! Quem é que vai reclamar que meu carro tá imundo, tirar sarro porque meu carro é de bate-bate, brigar de quem é a vez de dirigir? Quem vai comigo na drenagem, dividir vaidade dos cabelos brancos, dos perfumes, dos relógios?

Eu tenho tanto de você! Tanto pra me lembrar! Você me fez a pessoa que eu sou, até quando foi contra mim. Você me ensinou a me defender, a não ser feita de capacho de homem nem aceitar ser maltratada. Você me ensinou a dirigir, me incentivou a viajar sozinha, conhecer o mundo. Soube me dar asas sem que eu perdesse a razão. 

Saber que eu te dei orgulho nessa vida me fez tão bem! Que você confia em mim, que você me viu conquistar meu cantinho. Me doeu tanto, tanto, tanto quando você me perguntou "eu FUI um bom pai???".

Ah, pai, você não foi. Você É! Você vai ser pra sempre o melhor pai que eu podia ter. O que vivemos de ruim ficou pra trás, pouco me lembro. Eu tenho orgulho das tuas batalhas, das tuas vitórias, do teu progresso como ser humano. Da tua sabedoria, das pessoas que você ajudou, das marcas que você deixou em todos os lugares por onde passou.

Ah, pai! Eu não aprendi ainda a ter a tua nobreza de alma. Tenho dificuldade em perdoar, em relevar, e me ressinto de muitas pessoas nesse fim de jornada nossa neste plano aqui  

Ah, pai! Como foi difícil te ver agindo como a minha avó Maria com o pôr-do-sol, sentado nos gestos da minha avó Lourdes, com a rebeldia do meu vô Osmar. Não sei te explicar o amor que sinto quando você me olha falando coisas sem o menor sentido e eu sorrio e entro no embalo. As palavras não são suas, mas eu sei que em algum lugar você ainda está ali. Ainda é a mesma pessoa que eu sempre amei, embora seja tão diferente. E esse amor me dá paciência pra repetir, e divagar, e tentar te acalmar.

Ah, pai! Perdoe-me, menti pra você. Muitas vezes nestes últimos dias. Eu não tive coragem de te falar tudo o que eu sabia. Também não consegui fingir tão bem que nada estava acontecendo. Nós tentamos, pai, uma cura pra você. Mas você sofreu e nós falhamos. E agora, ainda é difícil abrir mão do nosso egoísmo e te confortar. Falta-nos força.

Essa vai ser a nossa oração. Eu não quero que você sofra quando você fizer a sua passagem. Nós tínhamos essa dívida, esse resgate. Essa é uma vitória nossa. Nossos espíritos evoluíram. Eu sei que a minha avó e outras pessoas estarão te esperando. Eu quero que você vá com eles, se cuide, se recupere. E quando você puder, quando te for permitido, volte. Quero sentir seu abraço de vez em quando. Quero matar a saudade um pouco. Quero recuperar a força pro tempo que eu ainda vou ficar aqui sem você. Porque eu sei que quando for a minha vez, você vai me esperar, me amparar como fez por toda a vida.

Eu te amo, pai. Um amor tão profundo que eu acho que valeu pelo que eu te devia. Eu chorei e choro por você todas as lágrimas que da outra vez eu não tive. E eu vou continuar cumprindo minha missão aqui, e eu sei que você vai continuar me ajudando.

Amo você. Amo você. Amo você. Amo você. Não me canso de dizer o quanto eu amo você.